quinta-feira, 30 de junho de 2011

T. Rex ~ Há aí alguém que ainda se lembre dele(s)?... (Parte 2)

O Guerreiro Eléctrico


Capa de Electric Warrior

Quando o single é posto à venda, já o longa duração seguinte estava na fase dos arranjos finais.  Publicado em Setembro, Electric Warrior, é registado durante a digressão do grupo pelos EUA, quer nos Media Sound Studios de Nova Iorque, quer nos Wall Heider Studios de Los Angeles, tendo posteriores adições e trabalho de produção (entregue uma vez mais, a Visconti) sido efectuados nos estúdios de Advision e Trident, de Londres.

«Na altura, nem sequer sabíamos que estáva-
mos a fazer um álbum.» – Tony Visconti(13)

Quinze dias depois de a Fly Records o ter disponibilizado, a 9 de Outubro, entra pela primeira nas tabelas britânicas, aparecendo no #2, aonde se mantém por mais uma semana.  Entre 23 de Outubro e 4 de Dezembro, sobe e desce mas nunca abaixo do #6.  A 18 de Dezembro, sobe ao topo e por lá se manterá nas cinco semanas seguintes.  Duas semanas depois regressa de novo ao #1 por outras duas semanas, e a partir daí começa a sua fase descendente, desaparecendo do Top 30 apenas vinte e três semanas mais tarde, a 22 de Julho de 1972, isto é, um dia depois de ter sido posto à venda o terceiro trabalho dos T. Rex, The Slider.

«No que me diz respeito, é o primeiro álbum
que fiz. Os outros foram apenas ideias, mas nes-
te falo sobre mim e ti, e todos nós.» – Marc Bo
lan(14)

Olhando para a capa de Aubrey Powell, o designer da Hipgnosis, construída a partir de uma foto tirada por Kieron “Spud” Murphy, na qual Marc Bolan, visto de um plano inferior (como se vê qualquer deus), aparece envolto numa auréola, a tocar guitarra eléctrica em frente de uns amplificadores, fica-se com a certeza de que ele é um Electric Warrior e de que o Rock eléctrico vai ser o mote, e quando se escuta o tema de abertura, Mambo Sun, não creio que apesar do ritmo nitidamente afro-latino e, por isso, pontuado pela secção rítmica, com a guitarra de Bolan mais eléctrica do nunca, a aparecer nos intervalos, se possa ter qualquer dúvida.  A vocalização de Bolan é sussurrante, como se estivesse a contar um segredo apenas para nós (Beneath the bebop moon/ I wanna croon, for you/ Beneath the mambo sun/ I got to be the one, for you… uh, for you, uh, you), contrastando em definitivo com os coros irremediavelmente tribais.  Cosmic Dancer, é um verdadeiro tema crooner adaptado à entrada da nova década de 70, com as cordas magistralmente introduzidas por Visconti a competirem com a guitarra acústica numa plena valsa, num hino completamente adolescente (I was dancing when I was twelve/ I was dancing when I was aaah/ I danced myself right out the womb/ Is it strange to dance so soon/ I danced myself right out the womb). A guitarra quando entra é toda ela distorção reforçando o carácter etéreo da vocalização, então substituída por um coro e uma bateria em plena angústia.  Jeepster é um Rockabilly com uma secção rítmica contagiante e uns rendilhados interessantes por parte da guitarra de Bolan, mas a melhor parte é o seu final completamente “descontrolado” (I say, girl, I’m just a vampire/ For your love/ And I’m gonna suck ya...) que, supostamente, foi gravado numa casa de banho, por sugestão de Finn, à imagem de algumas gravações de Elvis Presley para a Sun Records.  Monolith, cujo título é uma referência ao clássico de Stanley Kubrick, 2001: Odisseia no Espaço, faz-me lembrar as canções românticas dos finais da década de 50... com um excelente coro, quase Gospel, de Flo & Eddie, sublinhando a vocalização de Bolan (The throne of time/ Is a kingly thing/ From whence you know/ We all do begin).  Lean Woman Blues é o tema que encerra o lado um do disco com a sua interpretação indisciplinada dos blues.  A abrir o lado dois, o grande sucesso do grupo, Get It On, seguido de Planet Queen, uma composição que se enquadra perfeitamente na sequência do tema anterior, apesar das suas líricas pouco terem a ver uma com a outra e em que o refrão (Well it’s all right/ Love is what you want/ Flying saucer take me away/ Give me your daughter) vale por toda a música.  Girl é uma balada basicamente acústica, à qual Visconti adicionou algumas partes eléctricas mas essencialmente, o fliscorne tocado por Burt Collins, que a dota de uma certa melancolia irresistível.  The Motivator é Rock puro, aonde a guitarra e a vocalização de Bolan (I love the broken crown/ The one you stole from the King and held for ransom/ Love the broken crown/ Love the broken crown/ I love it), brilham com a preciosa ajuda dos arranjos de produção de Visconti.  Life’s A Gas é uma outra balada mas desta, com todas as condições – desde a sua melodia copiosamente penetrante até à sua letra simples mas eficaz, passando pelo refrão que cola à primeira audição – para não ser o que é: um dos temas menos conhecidos do grupo. A fechar o álbum, aquela que para mim é a sua canção menos conseguida, Rip Off, aonde Bolan nos brinda com uma raiva que de todo não é comum na sua discografia, contudo, hoje, descubro nela uma série de pistas para outras abordagens musicais mais recentes, nomeadamente no que toca a uma segunda vaga de grupos New-Wave.

«Então a que é que o Electric Warrior soa a-
gora, bem mais de um quarto de século desde
que o toquei pela última vez? A duh! respos-
ta é: soa a rock’n’roll.» – Charles Shaar Mu
rray(15)

Do álbum viria ainda a ser extraído mais um single, Jeepster/ Life’s A Gas, publicado em Novembro de 1971 pela Fly Records, sem a autorização de Bolan, que entretanto criara a sua própria etiqueta, a T.Rex Wax Co, e assinara um contrato para a distribuição do seu material com a EMI.

Marc Bolan


E Quando Estou Triste, Deslizo...


Em Janeiro de 1972, o novo single do grupo, Telegram Sam (com Cadillac/Baby Strange no lado B), é posto à venda em Inglaterra e em pouco tempo, ascende ao #1 das Charts aonde se aguenta por duas semanas.  Escrita por Bolan durante a digressão norte-americana Electric Warrior, terá sido inspirada no seu manager Tony Secunda que lhe enviava telegramas a pô-lo a par do sucesso do álbum (Telegram Sam/ You are my main man), e apresenta um som mais denso e pesado, mas sem perder o apelo contagiante dos seus anteriores sucessos e, depois, Bolan aparece mais seguro do que nunca, das suas capacidades quer como vocalista e guitarrista, mas também como letrista (Automatic shoes/ Give me 3-D vision/ And the California blues/ Me I funk but I don’t care/ I ain’t no square with my corkscrew hair).

Em Março seguinte, nos dois concertos de abertura da digressão britânica realizados no Empire Pool de Wembley, o grupo é filmado perante centenas de milhares de fãs por um deles, o ex-Beatle Ringo Starr, para um filme que se estreará em Dezembro com o título de Born To Boogie, e que contará ainda com a presença de Elton John.

Elton John, Bolan, Ringo Starr e Finn

Dois meses depois, aparece um novo single, Metal Guru (com Thunderwing e Lady do outro lado), que serve para promoção do próximo álbum.  Definido por Mark Paytress como «provavelmente, a declaração mais perfeitamente conseguida do som Bolan»(16), Metal Guru, apesar das guitarras eléctricas, é suficientemente pop para ser o sucesso da entrada do verão, conseguindo assim manter o grupo no topo das tabelas britânicas de 20 de Maio a 10 de Junho, por 4 semanas consecutivas.  Entretanto, a Fly Records que não andava a dormir e querendo capitalizar com a T. Rextasy, recupera todos os sucessos que tinha ao seu dispor e, em Abril desse ano, lança a colectânea Bolan Boogie, que ocupará em paralelo com o último single do grupo, as tabelas britânicas até 3 de Junho.

«Estamos a caminho do Château [d’Hérouville,
nos arredores de Paris] numa limusina.  Eu es-
tou sentado na parte de trás com o Marc e o Mi-
ckey, e o Marc está bêbado. São 11 da manhã e
ele está agarrado a uma garrafa de conhaque.
De repente, começa uma canção: “I’m an old
boon dog from the boon docks… Vamos toda a
gente a cantar”, diz ele.  É muito cedo, protes-
tamos. Há um elemento de medo no ar. O líder
está fora de controle.  (...) Para manter a paz,
Mickey começa a cantar: “I’m an old...”, “Sim
Mickey, é isso” diz o Marc e coloca o braço em
torno dele. Foi assim que se começou The Sli-
der.» – Tony Visconti(17)

Em Julho, sai o álbum The Slider.  Gravado basicamente no Château d’Hérouville, de Paris, com a sua produção a cargo do insubstituível Visconti a ser iniciada em meados de Março no Strawberry Studios, e posteriores gravações a serem efectuadas durante a sua digressão continental, em finais de Março, nos Rosenberg Studios de Copenhaga, enquanto os coros a cargo dos habituais Flo & Eddie, viriam a ser registados nos Elektra Studios de Los Angeles.

Os T. Rex com Tony Visconti

Metal Guru é um bom tema para abrir o álbum – quanto mais não fosse por ser já suficientemente conhecido.  Segue-se uma balada perfeitamente neutra, Mystic Lady, situada no velho universo pagão (Riding sliding Sorceress/ In your dungarees/ Got me on my knees) tanto a gosto de Bolan, que realça o génio de Visconti (com uma introdução dramática a cargo dos imprescindíveis violinos, mas também pelo uso sóbrio do mellotron e, acima de tudo, pelos coros com aqueles berros elucidativamente satânicos).  Com Rock On, escrita entre dois concertos durante a digressão nos EUA, o álbum acelera o ritmo: tensa, dramática, com um riff suficientemente violento para o tema que, evidentemente, é o mundo dos negócios do Rock’n’Roll (I’ve been down there/ Everybody’s been there/ Everyone everyone/ Desolation angel/ On the cover of my paper/ Loves everyone, everyone). O seu final, se me parece um tanto ou quanto forçado, não me custa a aceitá-lo tendo em vista uma sequência que realçasse a entrada da melhor música de todo o álbum: The Slider.  Que posso eu dizer de um tema que ficaria de bom grado a ouvi-lo uma vez mais, descobrindo sempre um pedaço mais para me maravilhar? Uma verdadeira obra-prima do duo Bolan-Visconti que deveria fazer parte de qualquer colectânea de Bolan, o que infelizmente não acontece.  Baby Boomerang é um regresso ao boogie, aonde creio serem evidentes as influências de um dos seus grandes ídolos, Bob Dylan, não só pelo estilo de vocalização a que recorre mas também pelo modo como construiu a sua letra (Slim lined sheik faced/ Angel of the night/ Riding like a cowboy/ In the graveyard of the night/ New York Witch/ In the dungeon of the day/ I’m trying to write my novel/ But all you do is play/ Baby Boomerang, Baby Boomerang/ Well, you never spike a person/ But you always bang the whole gang/ Oh yeah...).  Spaceball Ricochet é uma balada intimista, que me parece demasiado auto-briográfica para despertar grande interesse, e Buick MacKane serve para fechar o lado um do álbum, com a sua roupagem Hard-Rock, Bolan lança novas pistas para o futuro, demonstrando não estar desatento a novas tendências no Rock.  O lado dois abre com o outro single do ano, Telegram Sam, e a partir daí o tom torna-se mais sombrio e pesado.  Numa sequência angustiante, os temas que se seguem apresentam uma densidade sonora quase depressiva nunca antes revelada por Bolan – terá sido por isso que os Bauhaus recuperariam anos mais tarde, o tema de abertura deste lado do álbum? – e as letras reforçam esse estado de espírito (Tramp king of the city he’s my friend/ Moondog’s just a prophet to the end, ou I saw a dude unscrewed and badly turned/ Laughing/ ‘cos he’d gotten what he’d earned, em Rabbit Fighter;  The city’s shaking/ I ain’t faking baby this is the end/ I’m overloaded my head’s exploded, em Baby Strange; You talk about day/ I’m talking ‘bout night time/ When the monsters call out/ The names of men/ Bob Dylan knows/ And I bet Alan Freed did, em Ballrooms Of Mars;  e Baby you know who you are/ Don’t you know who you are?/ Standing on your porch/ You wear your pleasure like a torch/ Hiding in the road/ Like a pasolini toad, em Chariot Choogle).

O álbum, com a sua capa feita a partir de uma foto tirada por ocasião das filmagens de Born To Boogie, atribuída a Ringo Starr mas que Tony Visconti reclama como sendo sua, atinge a sua posição mais alta nas tabelas britânicas, duas semanas depois de ter sido publicado, a 5 de Agosto, ao ser o #4.  Até meados de Setembro alternará entre a quinta e a sexta posição e, a partir daí, descerá gradualmente até desaparecer da tabela dos primeiros cinquenta em finais de Janeiro de 1973.  Na tabela da Billboard nos EUA, a posição mais alta que consegue é a do #17.

Capa de The Slider

A 23 de Setembro, enquanto o álbum descia para o #12 nas tabelas britânicas, o single Children Of The Revolution (com Jitterbug Love/Sunken Rags do outro lado do disco) que tinha sido publicado no começo desse mesmo mês, ascendia ao #2.  Na minha opinião, ela é sem dúvida alguma a melhor música de sempre do grupo mas também o seu canto de cisne.  Servida por uma propulsão eléctrica enérgica por parte da guitarra de Bolan, é uma autêntica marcha cheia de veludo (as habituais cordas incorporadas por Visconti) e rímel (a secção rítmica), feita hino de uma parte da geração saída dos anos sessenta que assegura a sua convicção e comprometimento de não se deixar enganar mesmo que embriagados

Yeaahhhhh
Well, you can bump and grind
It is good for your mind
Well, you can twist and shout
Let it all hang out
But you won’t fool
The children of the revolution
No, you won’t fool
The children of the revolution, no, no, no

E recorrendo à ironia de um modo surpreendente:

I drive a rolls royce ‘cos it’s good for my voice

O single aguentar-se-ia mais duas semanas no #2 das tabelas britânicas, não tendo conseguido destronar as novas coqueluches quer do Glam Rock, os Slade, quer das adolescentes, David Cassidy.

«Children of the Revolution é vagamente polí-
tica à sua maneira, eu apenas não digo contra
quem ela é (sorrisos), percebes? Penso que te-
rão a oportunidade de escolher por vocês mes-
mos.» – Marc Bolan(18)

No final do ano lança o seu último grande sucesso, Solid Gold Easy Action (com Born To Boogie no lado B), que na primeira semana de 1973 consegue subir ao #2 das tabelas britânicas, começando a partir daí a cair a pique.

Marc Bolan


O Fim

Mas 1973 será um ano difícil para Bolan.  É por esta altura que o seu comportamento começa a apresentar mudanças que irão influenciar o futuro da sua carreira – o crescente consumo de álcool e cocaína começam a provocar os primeiros sintomas de dependência e a transformá-lo num megalomaníaco egocêntrico («No hit parade? De que é que estás a falar, homem? Eu sou o hit parade.» – Marc Bolan(19)).  June, a sua esposa, com o crescimento da máquina T. Rextasy começa a perder o controle que até então conseguira exercer de um modo quase maternal sobre ele, e os restantes membros do grupo começam a manifestar-se saturados de serem considerados como simples banda de suporte e de estarem limitados a ter de aguentar as suas excentricidades ditatoriais.

O golpe final deu-se quando Bolan inicia uma ligação emocional mais séria com Gloria Jones, uma cantora de música Soul, que conhecera em 1969 quando ela fazia parte do elenco de Los Angeles da peça Hair.  Desde então encontraram-se em diferentes ocasiões mas o seu envolvimento amoroso só se inicia quando em 1972, a Warner Brothers a inclui no coro para a actuação do grupo no Winterland de São Francisco.  Quando June descobre que entre eles não existia apenas uma simples ligação passageira, como tantas outras que existiram no passado, pede o divórcio e separa-se dele, e isso irá marcar definitivamente um Bolan que sempre contara com o juízo e o apoio da sua companheira.

Bolan e Gloria Jones

Não tendo conseguido conquistar a nova camada adolescente que entretanto descobrira novas estrelas assexuadas, como Davi Cassidy ou Little Jimmy Osmond, perdendo a batalha contra os novos nomes do Glam Rock quer nas tabelas, com os Slade ou os Sweet, quer junto dos críticos especializados que preferiam David Bowie, e atolado em problemas pessoais, Bolan reage da pior maneira, investindo contra os novos nomes que entretanto dominavam o Glam Rock, estilo que ele “criara” e que agora por já não o conseguir dominar, tenta declará-lo como morto(20).

«Não acredito que o David (Bowie) esteja algures
perto de ter o carisma ou as bolas, que eu tenho.
Ou o Alice. Ou o Donny Osmond. Ele não irá con-
segui-lo de qualquer maneira.» – Marc Bolan(21)

David Bowie e Bolan

«Foi uma coisa boa, mas foi há três anos e agora
em Inglaterra, tens os teus Sweet, Chicory Tip e
Gary Glitter... (...) para mim o que esses tipos es-
tão a fazer é circo e comédia, e eu tenho de me
desligar disso.» – Marc Bolan(22)

Em Novembro de 1973, o baterista Bill Legend abandona o grupo.  Em Março do ano seguinte, Visconti alegando as então habituais “diferenças musicais irreconciliáveis” afasta-se de Bolan e, em 1975, foi a vez de Mickey Finn o abandonar.

«Mas ele não queria parar um ano para se de-
senvolver. Ele dizia “Os miúdos precisam de
mim.”  Zinc Alloy foi o álbum que não conse-
gui tratar.  Era demasiado desligado, dema-
siado drogado. E vi aquilo com a Gloria (Jo
nes), ele ia por uma direcção pela qual eu de
qualquer modo, não queria ir. (...) O Marc tor-
nou-se menos generoso conforme mais suces-
so ia tendo. Senti que não já era necessário,
então parti.» – Tony Visconti(23)


«Acho que me cansei, que o Marc se cansou.
Chegamos ao fim da nossa ligação um com o
outro. Não com uma discussão, foi antes co-
mo uma atmosfera e surgiram muitos rumo-
res maus a propósito, e comecei a perder o in-
teresse e a não aparecer.» – Mickey Finn(24)

Megalomania, arrogância, complexo de Napoleão, passam a ser expressões ligadas a Bolan sempre que o seu nome aparecia nas publicações especializados.  Alguns singles e álbuns lançados a partir de 1973, com posições cada vez mais baixas nas tabelas, e algumas digressões com cada vez menos público, serviam para o manter na ilusão de que ainda era uma estrela que, para evitar ser violentamente tributada, tinha de viver exilado nos EUA...

Diz-se que um desmaio por esgotamento durante um dos seus concertos e o facto de saber que Gloria estava grávida tê-lo-ão feito regressar ao seu país de origem.  Depois de uma série de concertos em salas cada vez mais menores, de se ter tornado pai e de ter conseguido um programa de televisão, com o surgir do Punk Rock ainda tenta o seu regresso reclamando-se como o pai do novo estilo de Rock” mas na noite de 16 de Setembro de 1977, a morte encontrou-o numa estrada, num carro conduzido por Gloria Jones.

T. Rex na fase final

 Discografia para o período 1972~77:
   20th Century Boy/Free Angel (Mar/73 – EMI/Reprise), single;
   Tanx (Mar/73 – EMI/Reprise), álbum;
   The Grover/Midnight (Jun/73 – EMI/Reprise), single;
   Truck On (Tyke)/Sitting Here (Nov/73 – EMI), single;
   Zinc Alloy And The Hidden Riders Of Tomorrow (Fev/74 – EMI), álbum;
   Bolan's Zip Gun (Fev/75 – EMI), álbum;
   Futuristic Dragon (Jan/76 – EMI), álbum;
   London Boys/Chrome Sitar (Mar/76 – EMI), single;
   Laser Love/Life Is an Elevator (Set/76 – EMI), single;
   Dandy In The Underworld (Mar/77 – EMI), álbum;
   Celebrate Summer/Ride My Wheels (Ago/77 – EMI), single;


_______________________
(14) RAB, George. “T. Rex’s Electric Warrior”. Classic Albums Series. Record Collector, No. 217. September 1997.  p.20;
(15) MURRAY, Charles Shaar. “A dandy in aspic”. Filter. Reissues & Compilations. Mojo, No. 95. October 2001. p.132;
(16) PAYTRESS, Mark. “T. Rex”. Mojo, No. 138. May 2005. p.86;
(17) VISCONTI, Tony. “The Difficult Album”. Mojo, No. 138. May 2005. p.84;
(18) YOSHINARI, Nobuyuki. An Interview With Marc. 5th December 1972. Interviews, Reviews, and other Stories. The Till Dawn site. 2005;
(19) PAYTRESS, Mark. “T. Rex”. Mojo, No. 138. May 2005. p.86;
(20) PAYTRESS, Mark. “T. Rex”. Mojo, No. 138. May 2005. p.87;
(21) CROWE, Cameron. “What They Tried To Do With Bowie Was Create Another Marc Bolan”. Creem, July 1973; in MATHEU, Robert e BOWE, Brian J. Creem: America's Only Rock 'N' Roll Magazine. New York: HarperCollins Publishers. 2007. p.79;
(22) BAILEY, Andrew. “The Low-Profile Marc Bolan: Finished with ‘R&R Lunacy’”. Rolling Stone, No. 150. December 20, 1973. p.24;
(23) PAYTRESS, Mark. “Electric Warrior producer Tony Visconti talks to Mark Paytress. Info: Feature, Mojo 39”. Filter. Reissues & Compilations. Mojo, No. 95. October 2001. p.133;
(24) PAYTRESS, Mark. “T. Rex. The Survivors. The Record Collector Interview”. Record Collector, No. 210. February 1997.  p.75;

T. Rex ~ Há aí alguém que ainda se lembre dele(s)?... (Parte 1)

Eu não posso deixar de me lembrar pois que entre nós, há uma das mais profundas decisões da minha adolescência: algures em 1972, quando decidi oferecer a todos os meus amigos aniversariantes, uma cópia do single Children Of The Revolution.

Yeaahhhhh
Well you can bump and grind
It is good for your mind
Well, you can twist and shout
Let it all hang out
But you won’t fool
The children of the revolution
No, you won’t fool
The children of the revolution, no, no, no

Ou não fosse eu um filho da revolução...

Claro que já conhecia o exótico Ride A White Swan (Outubro de 1970), e o prestes-a-explodir Hot Love (Fevereiro de 1971), e essa loucura estrondosa que foi Get It On (Julho desse mesmo ano), e sei lá mais quantos sucessos que eles tinham conseguido colocar nas tabelas, mas nenhum me tinha conseguido apanhar pelas entranhas – porque eu gostava era dos Rolling Stones... e, na altura, um grupo com vários sucessos comerciais era para ser encarado com o sobrolho em riste e, pelo menos, uma pedrinha em cada um dos orifícios auditivos e depois, o máximo de androginia que eu estava preparado para admitir, eram os maneirismos do Jagger, e o Marc Bolan ia muito para além disso, com os seus bibes coloridos e sapatinhos de menina de ballet.
 
Marc Bolan


O Começo...

Bom, é um pouco complicado estabelecer-se um começo para o grupo porque antes de Bolan ser T. Rex, já era Tyrannosaurus Rex, se tivesse sido outra coisa qualquer poder-se-ia, definitivamente, falar em grupos diferentes, assim não.  Mas vamos por partes...

Marc nasceu Ferrel, antes de optar por ser Bolan, e desde muito cedo começou a demonstrar uma personalidade ambiciosa.  Aos quinze anos, abandona a escola e tenta vários biscates enquanto em paralelo, insiste numa carreira musical.  Como Toby Tyler grava várias músicas mas não consegue merecer qualquer tipo de atenção.  Em Novembro de 1965 e já como Bolan – «Quando o Mark mudou o seu nome, o Jimmy Bolam ficou muito ofendido porque achava ser verdadeiramente escandaloso que ele usasse o seu nome, então o Mark mudou o ‘M’ para ‘N’, tão simples quanto isso. Não teve nada a ver com o Bob Dylan.» – explica Riggs O’Hara(1) – faz sair através da Decca Records, o seu primeiro single, The Wizard/Beyond The Rising Sun, um exemplar antes do tempo de Rock psicadélico que não irá ter qualquer impacto na sua carreira.

«Quanto ao Wizard, bom, era apenas eu.  As
histórias que o Mark iria inventar sobre o Wi-
zard ser alguma outra pessoa foi a sua manei-
ra de me proteger.  Todo o mito que cresceu,
ele inventou-o.» – Riggs O’Hara(1)

No ano seguinte, ainda a solo, conseguirá fazer sair mais dois singles: um na Decca Records, em Junho, com os temas The Third Degree/San Francisco Poet, e outro em Dezembro, através da Parlophone Records, Hippy Gumbo/Misfit que, segundo se diz, recebeu alguns elogios por parte de Jimi Hendrix.

Em Fevereiro de 1967, o seu novo manager, Simon Napier-Bell, junta-o a um grupo que apesar de ser bastante popular no circuito ao vivo de então, nunca conseguiu traduzir isso através da venda de registos, os John’s Children, com o intuito de os dotar de mais uma guitarra, mas essencialmente de um letrista.  Bolan compõe para eles alguns dos temas mais conhecidos do grupo, Desdemona (editado em Maio) e Midsummer Night’s Scene (em Julho).

«Eles na verdade, queriam uma combinação
de Pete Townshend/poeta. E eu cabia à me-
dida.» – Marc Bolan(2)

Mas em meados do ano, ele abandona o grupo e uns tempos depois, com um personagem instável e que gostava de tocar instrumentos de percussão, Steve “Peregrine” Took, forma os Tyrannosaurus Rex, um duo essencialmente acústico que, segundo John & Shan Bramley, «(...) mostra um Bolan fortemente influenciado pela cena dos anos sessenta, quando a mensagem era Amor e Paz, e toda a gente que era alguém, carregava consigo cópias dos clássicos de Tolkien, o Hobbit e os três volumes de O Senhor dos Anéis. Marc levou as influências de Tolkien a um outro patamar, e desenvolveu o seu próprio mundo de anões, elfins, dragões e donzelas bonitas, e começou a desenvolver o seu próprio mundo, o ‘Rarn’.»(3)

Steve “Peregrine” Took e Bolan

Para o dueto, os primeiros tempos foram difíceis, percorrendo ruas movimentadas e saídas de estações de metro, até que o famoso DJ da Radio One, da BBC, John Peel resolve passar no seu programa uma das gravações do grupo enviadas pelo próprio Bolan.  Peel acabaria por vir a tornar-se num dos mais incondicionais seguidores do grupo exercendo pressão doravante para que eles venham a ser devidamente registados.

Em Abril de 1968, através da recém reavivada Regal Zonophone, uma subsidiária do EMI Group, sai então o primeiro single do grupo, Debora/Child Star, enquanto o seu primeiro trabalho de longa duração, com o ufa! nome de My People Were Fair And Had Sky In Their Hair... But Now They’re Content To Wear Stars On Their Brows, produzido por um yankee desconhecido e recém chegado a Londres, de nome Tony Visconti, e gravado nos Advision Studios, em Londres, acabaria por vir a ser publicado três meses depois, em Julho.  John Peel, para além de aparecer a declamar um dos poemas de Bolan no seguimento da última faixa listada do disco, Frowning Atahuallpa (My Inca Love), ainda aproveita os seus programas para divulgar repetidamente o álbum, apontando o duo como as novas estrelas da cena underground londrina.  O resultado do seu entusiasmo acabaria por verificar-se no #15 nas Charts britânicas, atingido pelo álbum.

O álbum é interessante, com alguns temas conseguidos mas, no geral, monótono e definitivamente marcado no tempo (quero dizer: naquela onda acústica-hippie) – ouvi-lo hoje é uma tarefa que exige alguma coragem e muita mais paciência, mas fica a excelente capa da responsabilidade de George Underwood.

No último fim de semana de Junho, o duo participa no primeiro concerto livre de Hyde Park, ao lado de alguns dos seus pares mais sonantes, ligados à cena underground londrina.

O álbum seguinte, Prophets, Seers & Sages-The Angels Of The Ages, gravado nos Trident Studios, de Londres, viria a ser publicado no princípio do quarto trimestre desse mesmo ano, e embora mais melódico e polido, é uma perfeita sequência do primeiro trabalho do duo.  Realce para a notável evolução na produção, uma vez mais entregue às mãos de Tony Visconti.  Em termos estritamente comerciais, deve ter sido um dos piores registos da Regal Zonophone o que não invalida o facto de, quatro anos depois, no pico da fama dos T. Rex, este e o álbum inicial terem sido reeditados sob um único título, Tyrannosaurus Rex: A Beginning, e de ter conseguido chegar ao #1 das Charts.

Steve “Peregrine” Took e Bolan

O terceiro trabalho do grupo, Unicorn, aparece em Maio de 1969.  Nada de novo quanto ao estúdio e ao produtor: Trident Studios e Tony Visconti.  Abro aqui um parêntesis apenas para dizer que, segundo se dizia na altura, Visconti desistira de um outro seu protegido, David Bowie, para se concentrar definitivamente na carreira de Bolan.  Nada de concreto sei sobre o assunto... talvez que para o desenvolvimento desse rumor, não seja alheia a notável evolução que os três discos do grupo apresentam em termos de produção: este último é sem dúvida alguma, o melhor deles.  O grupo apresenta-se mais concentrado e conciso, mas também mais vivo, e Visconti avança em paralelo com eles.  Claro, nas Charts conseguem a sua melhor posição de sempre, um #10.

Em Julho, o seu público é surpreendido com o single King Of The Rumbling Spires/Do You Remember, aonde Bolan aparece a tocar guitarra eléctrica e, pouco tempo depois, embarcam numa primeira digressão pelos EUA.  É nesta digressão que o duo se separa em definitivo, oficializando uma situação que já existia, de facto, há algum tempo: Bolan optara por levar a sua carreira mais a “sério” enquanto Took se embrenhava cada vez mais no underground e isso implicava, para ambos, estilos de vida diferentes.  Quando a digressão chegou ao fim, um Took diariamente em ácido, desapareceu para sempre com uma miúda qualquer que conhecera uns dias antes...

«Ele queria incendiar a cidade e colocar á-
cido na canalização da água. (...) Concor-
dámos em acabar, mas estávamos legalmen-
te obrigados a fazer a nossa primeira digres-
são americana. Nós fizemo-la, mas foi um
desastre.» – Marc Bolan(2)

Pouco tempo depois, num restaurante vegetariano, Bolan encontra o seu novo parceiro, Mickey Finn, um pintor psicadélico já então relativamente popular e que, segundo dizia, sabia tocar tambores africanos.

«eu conheci-o por acaso e ele foi muito, mui-
to persistente. (...) E ele apareceu no dia se-
guinte, e nós como que deitámos fogo à casa.
A próxima coisa, estava a caminho de um lu-
gar chamado Plas, em Gales, aonde trabalhá-
mos o  “Beard Of Stars”.» – Mickey Finn(4)

Em Janeiro de 1970, sai o single By The Light Of A Magical Moon/Find A Little Wood, anunciando para breve um novo álbum:  A Beard Of Stars, o quarto e último trabalho dos Tyrannosaurus Rex é como que a versão eléctrica do habitual som acústico de Bolan que, por isso, perde aquele ambiente oriental que o caracterizava.  Como a maior parte do material já tinha sido gravado com Took, foi necessário por isso “limpá-lo” e, por sua vez, a presença de Finn é quase nula, incluindo nos coros, que foram construídos por Visconti através da multiplicação em estúdio, da voz de Bolan.  Gravado uma vez mais nos já habituais Trident Studios, é lançado pela Regal Zonophone a 13 de Março de 1970 e, no dia seguinte, aparece nas Charts britânicas na mais alta posição que irá conseguir, o #21.  Apesar de já terem realizado uma digressão pelos EUA, é com este álbum que os Tyrannosaurus Rex conseguem pela primeira vez, que um registo seu seja disponibilizado naquele país, tendo a editora ido buscar o álbum anterior, Unicorn, e posto-o à venda na mesma altura.

«Algumas das músicas do lado um são boas,
mas nenhuma se compara com as inspiradas
melodias de Unicorn, e o lado dois é chato e
auto-indulgente.» – Ken Simmons(5)

Mickey Finn & Bolan


Montando Um Cisne Branco

A pouca receptividade com que o último álbum do duo é recebido, provoca em Bolan uma profunda desmotivação, o que o leva inclusive a encarar a hipótese de abandonar a carreira musical e a dedicar-se apenas à poesia – em 1969, ele chegara a publicar um livro com alguns dos seus poemas, intitulado The Warlock Of Love.  Terá sido a sua mulher, June, que farta de o ver a arrastar-se pela casa, quem o obriga a fechar-se num quarto e a só sair de lá com novos temas.

Bolan e June Childe

Uma das composições que June encontrou no dia seguinte, captou-lhe de imediato a atenção, e nesse mesmo dia, incitado por ela, Bolan entra em contacto com Visconti para iniciar a sua gravação.  A 1 de Julho, no Trident Studios, Bolan e Visconti gravam Ride A White Swan que, com Is It Love/Summertime Blues no lado B, é posto à venda a 9 de Outubro, por uma independente recentemente criada, a Fly Records, aparecendo na capa do disco, o nome do grupo já abreviado para T. Rex – «A mudança de Tyrannosaurus Rex para T. Rex foi em muito arquitectada pelo Tony.» – Rick Wakeman(6).  A música é basicamente montada a partir da guitarra de Bolan sobreposta quatro vezes, com partes de baixo também tocadas por ele, e uma secção de cordas adicionada por Visconti.  No dia 24 entra pela primeira vez nas Charts, no #47, e apenas a 14 de Novembro atinge o #30.  Aparentemente, o single parecia destinado a ser mais um fracasso, até que alguém na Radio One resolveu pô-lo no ar... ao longo dessa semana, outras estações iriam acabar por lhe dar também algum tempo – nas Charts do fim da semana, o single subiria para o #15 e, sempre a subir, atingiria o #2 a 23 de Janeiro de 1971, e era tudo, aparentemente, tão simples quanto a explicação de Bolan para esse acontecimento: «A maioria dos sucessos pop são uma variante dos blues de 12-barras. Eu encontrei uma que funciona.»(7).

«“Ride a White Swan” é um bom disco, um
disco inteligente, e um disco próximo-de-ser
-sucesso.» – Paul Gambaccini(8)

Novas sinergias alimentavam agora a parceria Bolan/Visconti: um novo álbum é de imediato iniciado aproveitando o energético regresso provocado pela esperança que Ride A White Swan provocara e, em aproximadamente um mês, o grupo regressa aos Trident Studios para gravar o álbum que viria a ser conhecido por T. Rex, com Bolan encarregando-se das guitarras, baixo, teclas e vocalização, Finn das congas e, esporadicamente, do baixo, e Visconti, para além do seu trabalho de produção, dando uma mãozinha nas teclas.  Dois ex-membros dos Turtles, Howard Kaylan e Mark Volman, amigos de Bolan desde o tempo da sua primeira digressão pelos EUA, agora já sob o enigmático nome de Flo & Eddie, de passagem por Londres como parte do grupo Mothers Of Invention, dão uma ajudinha nos coros (em Seagull Woman) que geralmente são da responsabilidade de Finn e Visconti.

Ride A White Swan

Posto à venda a 18 de Dezembro, cerca de um mês depois, aparece pela primeira vez nas Charts.  Uma semana mais tarde, a 23 de Janeiro de 1971, sobe dois lugares para o #22 e, na semana seguinte, desce para o #25.  A 12 de Fevereiro, é posto à venda o single Hot Love que já vinha a ser divulgado há uns dias pelas rádios inglesas, e no dia 13, o álbum que entretanto desaparecera das tabelas reaparece de novo e passa para o #7.

Marc Bolan

Muito mais Rock do que o anterior mas sem a magia de Unicorn, utiliza ainda a imagética hippie do aí-vêm-os-extra-terrestres-salvar-nos, enunciada no tema de abertura, The Children Of Rarn (We are the children of Rarn/ And we are the seekers of space/We’ve seen our master’s face/It’s young and gold/ And silvery old/ We are the seekers of space/ OM).  Jewel, por muito minimal que seja, é uma faixa com uma guitarra que nos leva para a selva; The Visit é mais um pedaço de ficção científica hippie (It was noon/ A ship of the silverest metal/ Shadowed out/ All of the moon/ A shape/ That was golden and crimson) sem qualquer interesse relevante, e de Childe esperava mais… ou antes, melhor.  The Time Of Love Is Now é uma faixa de que gosto em especial, não só pela sua letra (Light up your face/ With all the love within you/ Say your word/ Make it heard/ Light up the wind/ With all the kings inside you/ Shout it out/ Have no doubts/ For the time of love is now) mas também pela sua construção dramática que, deduzo, tenha os dedos mágicos de Visconti – bom, se esquecer a maneira como termina...  Se Diamond Meadows é despropositada, Root Of Star tem uma guitarra que me volta a exigir alguma atenção – é a magia de Unicorn, uma vez sem exemplo, de regresso... e, para terminar o lado um do álbum, Beltane Walk, um tema pop com muito swing não só pelo trabalho de Visconti (o que seria do tema sem aquela secção de cordas?) mas também pela própria vocalização de Bolan.  A abrir o lado dois, um pedaço de boogie, curto e eléctrico, com Is It Love?;  One Inch Rock é a recuperação de uma canção antiga – uma das recuperações, a outra é The Wizard, mas que nada acrescentam aos originais.  Summer Deep, Seagull Woman e Suneye são para esquecer.  Resumindo: algumas faixas boas... Jewel, The Time Of Love Is Now, e Beltane Walk; uma interessante em Root Of Star, e o resto, ou seja, muito mais de dois terços do álbum é material medíocre.

«Surpreendentemente, tudo saiu rock and roll;
não há que questionar isso. Mas rock and roll
com letras que falam de temas tais como magos,
druidas, e uma Poetisa Líquida num vestido de
camurça. Bolan é claramente um apaixonado
pelo misticismo, assim como pelo puro som da
língua Inglesa.» – Todd Everett(9)

Na capa do disco, uma foto tirada pelo fotógrafo do grupo, Pete Sanders, aos dois membros do grupo, com um Bolan em pose com a sua guitarra eléctrica, ambos com o rosto coberto por uma máscara branca de maquilhagem.  Sanders explica o enredo: «Tudo isso fazia parte da nova imagem eléctrica que o Marc estava a tentar criar e era por isso que ele queria ser fotografado com a sua guitarra eléctrica. O Marc era meticuloso acerca da imagem.»(7)

Capa de T. Rex

Rapidamente o grupo passa a quatro peças, tendo entrado Bill “Legend” Fyfield para a bateria, e Steve Currie para o baixo, em finais de Novembro.  É com esta formação que os T. Rex irão gravar nos IBC Studios, o single Hot Love.  Publicado pela Fly Records em Fevereiro de 1971, com Woodland Rock/King Of The Mountain Cometh no lado B, em cerca de um mês atinge o #1 das Charts, aonde se irá manter até Maio.

T. Rex

Inspirada na Hey Jude dos Beatles, Hot Love é, quanto a mim, muito mais simples e a coda nela funciona como uma expressão de garra e alegria, quase um grito arrogante de revolta.  Algo que ainda convém realçar, é a mudança no estilo de escrita de Bolan, regressando a algo mais básico e hedonista (Well she ain’t no witch and I love the way she twitch... a, ha, ha.../ I’m a labourer of love in my persian gloves... a, ha, ha…) e, depois, toda uma atitude adolescente e rebelde que viria a ser realçada nas suas actuações ao vivo...

Marc Bolan

Com o single colocado no #1 das tabelas britânicas, o grupo aparece no programa de televisão da BBC para adolescentes, o Top Of The Pops, em 24 de Março, com um Bolan maquilhado com lágrimas brilhantes, à la Pierrot, e um decote andrógino numa farda de marinheiro, sempre com aquele ar de uma Elizabeth Taylor de reputação duvidosa – a imprensa musical começa então a falar em Glitter Rock, termo de aonde surgiria, algum tempo depois, o chamado Glam Rock.

«A 9 de maio, a primeira noite no Winter Gar-
dens, de Bournemouth, os fãs atropelavam-se
uns aos outros para chegarem mais perto do no-
vo Messias.  Duas noites depois, no Guildhall,
em Portsmouth, o DJ Bob Harris lembra-se das
raparigas se aproximarem de Bolan com tesou-
ras, depois do concerto, na esperança de corta-
rem um anelzito da sua cabeça, como prémio.
“Na altura em que chegámos a Glasgow (21 de
Maio)”, diz Harris, “as cenas foram inacreditá-
veis. Chegámos com uma escolta da polícia, e o
jornal de lá tinha um título grande cruzando a
sua capa – ‘T.REXTASY!’”»(10)

A T. Rextasy alastra rapidamente  por todos os cantos da velha Albion e aonde o grupo actua, é invariavelmente a histeria completa.  Em Julho, sai o seu single mais popular de sempre, Get It On.  Em apenas uma semana, passa do #21 para o #4 da tabela.  Na semana seguinte, a 24 de Julho, chega ao #1 aonde se mantém por quatro semanas.  Nos EUA, com o título modificado para Bang A Gong (Get It On) para evitar ser confundida com uma canção do grupo The Chase (há também quem diga que terá sido por causa da conotação sexual expressa pelo título(11)), pela primeira vez, o grupo consegue alcançar o Top Ten da Billboard.

«“Bang A Gong” usa “dirty sweet” com o seu
máximo valor de carinho e isso é apenas a pon-
ta do icebergue. (...) os gritos e gemidos excita-
dos de Bolan fazem do disco uma obra-prima
cómico-erótica.» – Dave Marsh(11)

Basicamente gravado nos EUA, mais propriamente nos Wall Heider Studios de Los Angeles, conta de novo com a presença do duo Flo & Eddie nos coros.  Em gravações posteriores, efectuadas nos Trident Studios, aonde a música também viria a ser misturada, aparece nas teclas, Rick Wakeman e, nos metais, Ian McDonald dos King Crimson.

«Esse dia, foi em muito uma celebração, lem-
bro-me de que tínhamos por lá montes de be-
bida, um pouco de champanhe. O Bolan era
muito uma pessoa de sensações. Se a sensação
estivesse lá, nós fazíamos a coisa em dois ou
três takes.» – Tony Visconti(12)

Pela primeira vez, desde que se conhecem, John Peel recusa-se a passar no seu programa uma música do grupo – Bolan nunca lhe irá perdoar isso! – e eu até o compreendo pois lembro-me de, na altura, ter achado que mais comercial do que aquilo não poderia haver.  Ouvindo-a hoje, longe dos dilemas e paranóias de que vivíamos então, a canção tem um ritmo primitivo e contagiante (Bolan atribuiu a sua inspiração a Little Queenie de Chuck Berry (daí a frase final, And meanwhile, I’m still thinking, extraída desse clássico) que envelheceu com toda sua sensualidade intacta.

«O Marc trouxe-me uma etiqueta branca ou
um acetato. Depois de o ouvir, pensei que se
não fosse do Marc eu não o passaria. Então
não o devia passar.» – John Peel(13)


_______________________
(1)   BARDEN, Martin. “The Wizard Unmasked!”. Record Collector, No. 217. September 1997.  p.26;
(2)   HODENFIELD, Chris. “Tyrannosauros Enters Rock Age”. Rolling Stone, No. 91. September 16, 1971. p.71;
(3)   BRAMLEY, John & Shan. “The Early Years”. Marc Bolan & T-Rex Anthology CD sleeve notes. Essential Records. 1991;
(4)   PAYTRESS, Mark. “T. Rex. The Survivors. The Record Collector Interview”. Record Collector, No. 210. February 1997.  p.74;
(5)   SIMMONS, Ken. “Unicorn. A Beard Of Stars”. Records. Rolling Stone, No. 63. July 23, 1970. p.32;
(6)   PAYTRESS, Mark. “T. Rex”. Mojo, No. 138. May 2005. p.76;
(7)   PAYTRESS, Mark. “T. Rex”. Mojo, No. 138. May 2005. p.78;
(8)   GAMBACCINI, Paul. “Ride a White Swan”. Singles. Rolling Stone , No. 76. February 18, 1971. p.56;
(9)   EVERETT, Todd. “T.Rex”. Records. Rolling Stone, No.87. July 22, 1971. p.42;
(10) PAYTRESS, Mark. “T. Rex”. Mojo, No. 138. May 2005. p.82;
(11) MARSH, Dave. “905 Bang A Gong (Get It On), T. Rex”. The Heart Of Rock & Soul: The 1001 Greatest Singles Ever Made. New York: Da Capo Press. 1999. p.574;
(12) “92. Bang A Gong (Get It On). T. Rex”. The 100 Best Singles Of The Last Twenty-five Years. Rolling Stone, No. 534. September 8th, 1988. p.144;
(13) PAYTRESS, Mark. “T. Rex”. Mojo, No. 138. May 2005. p.83;